Opinião

Enquanto nós descansamos

Chegaram os dias longos, as festas populares, os concertos ao ar livre. Começam as viagens, os banhos de mar, o reencontro com quem vive longe. É tempo de parar um pouco. E é justo que o façamos. Trabalhámos muito. Merecemos o descanso, o convívio, a pausa.

Mas enquanto desligamos notificações, há sirenes que não param. Enquanto marcamos férias, há famílias a fugir das suas casas. Enquanto preparamos churrascos, há cidades a ferro e fogo, sob drones e mísseis. A guerra na Ucrânia continua. Gaza continua a sangrar. O Irão entrou no mapa dos bombardeamentos. E os EUA não ficaram de fora. Não é ficção. Está a acontecer e sabemos disso.

Mas também sabemos que, nos próximos meses, vamos dar menos importância a tudo isso. Não por maldade. Apenas porque o verão tem esse efeito: abafa o ruído do mundo e faz-nos acreditar que tudo pode esperar até setembro.

Só que nem tudo pode. E nem todos podem. E por causa disso há quem não chegue até setembro.

Esta crónica não é um apelo à culpa. É apenas um lembrete de que o privilégio do descanso não é universal. Há quem não tenha verão, nem pausa, nem paz. E é por isso que, mesmo quando desligamos, é bom manter a consciência acesa. Não para nos entristecermos, mas para nos mantermos humanos.

Podemos e devemos descansar. Mas que o nosso descanso nunca se transforme em indiferença. Que a leveza do verão não apague a gravidade do mundo. E que, mesmo quando tudo parece distante, saibamos continuar atentos, disponíveis e, sobretudo, gratos.

Descansar é um direito. Mas tê-lo ainda é, para muitos, um luxo.

 

 

(Crónica escrita para Rádio)