A recente queda do governo liderado por Luís Montenegro representa mais um capítulo conturbado na instável paisagem política portuguesa. Trata-se de um episódio que expõe não apenas as fragilidades de um executivo mal preparado para enfrentar as exigências do poder, mas também, o profundo desgaste da confiança pública na classe política. O escândalo que envolveu o Primeiro-Ministro, revelou um conjunto de práticas e decisões que colocam em causa os princípios básicos de ética e transparência que se exigem a um governante num Estado de Direito.
A origem do problema está numa relação obscura entre Montenegro e a empresa Spinumviva, da qual era fundador. Apesar de ter transferido a titularidade da empresa para a sua esposa antes de assumir funções governativas, a verdade é que, em regime de comunhão de bens, essa separação legal não bastou para afastar dúvidas legítimas sobre conflitos de interesse.
O caso tornou-se ainda mais grave quando se descobriu que a Spinumviva continuava a receber mensalmente valores significativos – cerca de 4.500 euros – de uma empresa de casinos com concessões do Estado, a Solverde. Esta ligação, que teria de ser escrutinada com o máximo rigor, foi minimizada pelo próprio Primeiro-Ministro, alimentando assim, suspeitas que levaram ao desgaste da sua credibilidade.
Montenegro rejeitou qualquer irregularidade, procurando enquadrar o caso como um ataque político, mas falhou em apresentar explicações claras e convincentes ao país. Em vez de promover o esclarecimento cabal dos factos, Montenegro e a maioria parlamentar recusaram liminarmente a criação de uma comissão parlamentar de inquérito. Essa decisão, que se tratou de uma tentativa de travar o apuramento da verdade, serviu apenas para intensificar as suspeitas e aumentar a indignação tanto dentro como fora do Parlamento. A recusa de um instrumento legítimo e democrático de fiscalização – particularmente num caso com evidentes implicações éticas – revelou uma preocupante falta de compromisso com a transparência. A alternativa foi a apresentação de uma moção de confiança, pelo próprio governo, numa tentativa de pressão política, revelando-se um erro estratégico e uma lamentável forma de esconder a verdade dos factos.
A solidez de uma democracia não reside apenas na realização de eleições, mas na conduta ética e responsável daqueles que assumem a liderança do Estado. É também um alerta para a necessidade de reforçar os mecanismos de escrutínio ético e legal dos titulares de cargos públicos, bem como, de promover uma cultura política menos tolerante à ambiguidade e ao favorecimento pessoal.
O PS tem a oportunidade de liderar esse processo, não como um regresso ao poder pelo poder, mas como uma resposta firme à crise profunda que atinge a democracia portuguesa. O Pedro Nuno Santos tem-se distinguido por um perfil combativo, de discurso claro e convicções firmes, para além de possuir capacidade de decisão, firmeza ideológica e proximidade com os problemas reais das pessoas. Acredito que, com a sua experiência e uma liderança pautada pela humildade e firmeza, tem não apenas a capacidade de se tornar Primeiro-Ministro, mas também de se afirmar como o símbolo de uma nova etapa na política portuguesa — uma etapa que rompa com o cinismo e devolva dignidade, verdade e propósito à função pública.