Opinião

Crise política nos Açores: o desfecho natural

É bom recordar que o Presidente da República justificou o rompimento da prática constitucional de indigitar o líder do partido mais votado (Vasco Cordeiro do PS) com a necessidade de “não se perder tempo” com uma solução que se sabia não ter o suporte da maioria parlamentar.

Em novembro de 2020, o Representante da República indigitou José Manuel Bolieiro Presidente do Governo Regional dos Açores. Na ocasião, Pedro Catarino justificou a indicação do segundo partido mais votado com base no acordo de coligação que o líder do PSD/Açores apresentou com o CDS e com o PPM e, ainda, com os acordos de incidência parlamentar entre estes e a IL e o Chega. Afirmou, também, que estes acordos visavam assegurar a estabilidade governativa e a aprovação dos orçamentos para o prazo da legislatura.

É bom recordar que o Presidente da República justificou o rompimento da prática constitucional de indigitar o líder do partido mais votado (Vasco Cordeiro do PS) com a necessidade de “não se perder tempo” com uma solução que se sabia não ter o suporte da maioria parlamentar.

Três anos volvidos, a proposta de Orçamento para 2024 tem chumbo pré-anunciado. Em março, a Iniciativa Liberal denunciou o acordo de incidência parlamentar com a coligação e, este mês, PAN, IL e Chega anunciaram que não votariam a favor do orçamento por não terem confiança no Governo Regional. Ou seja, a base parlamentar que serviu para dar posse ao governo da coligação PSD, CDS e PPM deixou formalmente de existir. Perante esta circunstância, os líderes da coligação têm insistido na ideia de que a Lei de Enquadramento Orçamental da Região Autónoma dos Açores obriga a apresentação, no prazo de 90 dias, de uma segunda proposta de orçamento e só perante um segundo chumbo poderá o Presidente da República dissolver a Assembleia Legislativa. Esta é uma interpretação politicamente motivada e sem respaldo jurídico. Na verdade, nos termos constitucionais, a dissolução da ALRAA é um ato político livre do Presidente da República bastando, para o efeito, que sejam observados os seguintes requisitos: audição prévia do Conselho de Estado e dos partidos representados na Assembleia objeto de dissolução. Assim, a ideia de que o Presidente da República teria, obrigatoriamente, de esperar por um segundo chumbo orçamental resultaria numa inaceitável e inconstitucional compressão dos poderes e das competências do chefe de Estado.

Perante o chumbo do orçamento e a perda de apoio parlamentar, o desfecho para a crise política nos Açores é óbvio. Para ser coerente com os fundamentos que motivaram a indigitação do segundo partido mais votado – e até “para não perder mais tempo” - só resta ao Presidente dissolver o Parlamento Regional e convocar eleições antecipadas.