Opinião

Identidade e modernização

À pergunta o que motivou a reabilitação do centro histórico de Ponta Delgada nos últimos meses, a resposta será unânime: a alteração ao modelo de transporte aéreo. Desde março de 2015 este foi o móbil de mudança em Ponta Delgada. As medidas municipais de incentivo no centro histórico hoje em vigor são as mesmas desde 2008. É amplamente reconhecido que a autarquia nada faz para reabilitar o centro histórico e assegurar a sua identidade. Numa avaliação distanciada na edição de 2 de dezembro na revista Visão foi publicado o artigo intitulado “13 razões para voltar a Ponta Delgada”. Nenhuma é de iniciativa municipal. Doze privadas e uma pública. A única pública é o espaço do Núcleo de Santo André. Foi o empreendedorismo dos privados que se mobilizou. Reabilitaram-se espaços comerciais e habitacionais. Surgiram novos negócios. Estes espaços e novos negócios transformam a cidade. A par desta transformação, e na ausência de plano de salvaguarda do centro histórico, assiste-se, de braços cruzados, a “crimes” arquitetónicos e de desvalorização da identidade. É inacreditável que uma cidade como a de Ponta Delgada, com a história que lhe é conhecida e reconhecida, não possua este instrumento de ordenamento. O resultado é o que se assiste, a adulteração de espaços pertença da história do centro histórico. Tudo se reabilita sem orientação. Quantos mais marcas do passado se perderão? Não há bela sem senão. É para equilibrar os “senões” que existem opções camarárias. Opções políticas. Vivemos hoje, por razões diferentes do passado, uma predisposição para o arrendamento de imóveis. A autarquia poderia recorrer a instrumentos municipais, como o IMI, para promover a reabilitação de imóveis em ruínas ou devolutos, incentivando a reabilitação e o mercado de arrendamento – proposta recusada por José Boleeiro. Por razões do fluxo turístico que gera uma pressão exercida pela instalação de alojamento local no centro histórico, é urgente uma avaliação no equilíbrio entre imóveis ocupados por residentes e por turistas. O que vale um centro histórico sem a sua comunidade? Pela segunda vez, neste século, o centro histórico de Ponta Delgada vive o fenómeno de desertificação de identidade. Primeiro promoveu-se a expansão da cidade a norte (São Gonçalo) e hoje vive-se a ocupação da identidade por alojamentos locais. Perante os i n s t r u m e n t o s que a autarquia tem ao seu dispor, o equilíbrio entre a valorização da identidade e a modernização – que será o tema para o artigo da próxima semana – está ausente das opções políticas. A tod@s um Feliz Natal com saúde e amor!