Opinião

Porque eu (ainda) estou viva

Escrevia há dias o Dr. Carlos Melo Bento neste mesmo jornal o seguinte: “Hoje quase ninguém da nova geração se lembra de quem foi Mota Amaral. E estamos todos vivos!”… A frase, admito que descontextualizada do artigo de opinião deste ilustre comentador da nossa praça, veio-me à memória ao longo de toda a semana. Volta e meia lá vinha ela, até que veio destacada, também, no jornal de Domingo. Pois claro. Não deixa de ser (de facto) uma grande verdade. Uma verdade (quase) absoluta. Não acredito que de propósito (quem me dera poder acreditar que na vida havia coisas destas sobrenaturais) as notícias da semana passada (posteriores ao artigo do Dr. Carlos Melo Bento) trouxeram-nos uma “nova” sobre a vida do Dr. Mota Amaral em Lisboa, que me fez lembrar a frase, outra vez. Ora, diziam as notícias (que não foram desmentidas) que a nova Presidente da Assembleia da República atribuiu ao Dr. Mota Amaral, na qualidade de ex-presidente do Parlamento, um gabinete, uma secretária, um BMW 320 e um motorista. Podemos extrapolar sobre o assunto o que quisermos, é claro, mas há duas conclusões a que chegamos rápido: a primeira é de que a Assembleia da República não aplica à própria instituição os cortes que na crise actual o Governo tem vindo a impor aos portugueses; a segunda é de que o Dr. Mota Amaral, sendo solidário com o Governo da República, não é solidário com os portugueses em geral nem com os açorianos em particular. A “nova geração” de que fala o Dr. Carlos Melo Bento esperaria talvez que o Dr. Mota Amaral dispensasse estas mordomias. Seria uma atitude natural atentas as dificuldades do país…Mas não (ao que parece). A semana que passou também trouxe de Lisboa outra notícia. A Assembleia da República aprovou na generalidade, a proposta de Lei do Governo para a criação da sobretaxa em sede de IRS de 50% do subsídio de Natal, com os votos favoráveis dos deputados do PSD e CDS/PP. A Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, chamada a dar parecer sobre o assunto, considerou que a Proposta de Lei em causa violava a Constituição da República Portuguesa, o Estatuto Político Administrativo da Região Autónoma dos Açores e a Lei de Finanças das Regiões Autónomas. Parecia que o PSD/Açores (que se candidatou às eleições da República pela enésima vez com o Dr. Mota Amaral como cabeça de lista) demonstrava bom senso e, pela defesa dos interesses da Autonomia, estava consciente desta situação. Acrescia ainda que a líder dos sociais-democratas açorianos (estejam eles na China, em Lisboa ou no Corvo, acredito eu), a Dra. Berta Cabral, entendia, tal como Carlos César, que as receitas desta taxa extraordinária que os açorianos vão pagar deviam ser da Região. Estava pois tudo a modos e a postos para ter os políticos Açorianos unidos pela defesa dos Açores. Mas (há sempre um “mas” para nos desmanchar a ilusão) de lá, de São Bento, veio a notícia fatal: os três deputados do PSD/Açores, entre eles, o Dr. Mota Amaral, votaram a favor da proposta do Governo da República. “Solidários com o Governo” (da República) – disseram as notícias. Pois é. Porque optam os três deputados do PSD/Açores na Assembleia da República, por abdicar da solidariedade para com a gente que os elegeu (os Açorianos), abdicando ainda deste princípio absoluto: os impostos pagos nas Regiões Autónomas devem ficar nas Regiões? Ao final da tarde de sexta-feira, o PSD/Açores divulgou um comunicado aos órgãos de comunicação social. O assunto não era fácil. Como explicar esta falta de solidariedade dos deputados Mota Amaral, Joaquim Ponte e Lídia Bulcão na Assembleia da República para com o povo que os elegeu e para com o seu próprio partido? Ninguém apareceu. No telejornal da RTP/Açores o jornalista citou o comunicado. A “nova geração” não conhece de facto este quadro. Mas eu conheço. E como não era nem “Noite de Verão” nem havia Sopas para anunciar a toda a gente, fez-se (quase) silêncio. Totalmente sem rosto. E é pena que assim seja mas é o que há ou como dizem os mais resignados: o que pode haver.