Opinião

As palavras que já não servem

Há palavras que já não chegam. Que perderam o peso, o brilho, o sentido. Palavras que ouvimos tantas vezes, em tantos discursos, que deixaram de nos dizer alguma coisa: compromisso, responsabilidade, rigor, transparência, futuro.

São palavras que continuam a ser ditas com cerimónia. Escrevem-se em programas eleitorais, em comunicados oficiais, usam-se em debates. Mas nas ruas, nos cafés, nos corredores das organizações, já não provocam reação. Já não convencem. Deixaram de mobilizar.

Talvez porque foram usadas em excesso. Talvez porque foram usadas sem consequência. Ou talvez porque as pessoas começaram a perceber que o que se diz e o que se faz raramente andam juntos.

Não é que as palavras estejam erradas. É que deixaram de servir para o que eram. E quando uma palavra deixa de ter valor, não é a palavra que falha — é quem a usa que falha.

A política precisa de discurso. Claro que sim. Mas precisa, sobretudo, de discurso que se aguente depois da frase terminar. Palavras que durem mais do que um ciclo noticioso. Palavras que não peçam desculpa por serem sérias.

Porque se tudo soa a ensaio, se tudo parece calculado, se cada frase é pensada para agradar a todos — as pessoas deixam de ouvir. E quando deixam de ouvir, deixam de acreditar. E quando deixam de acreditar, qualquer ruído serve de resposta.

Talvez não seja preciso inventar novas palavras. Talvez baste voltar a dar sentido às mesmas. A pô-las em prática. A correr o risco de dizê-las com consequência.

E então, talvez com o tempo, as palavras voltem a ter o seu verdadeiro sentido. Como ponte. Como compromisso. Como verdade.

 

(Crónica escrita para Rádio)