Opinião

Nem que rolem cabeças…

O maior mal do mundo não é a pobreza dos desafortunados, mas a inconsciência dos privilegiados.

Padre Lebret

E eis que entrou um marmoto. A tal mudança de paradigma orgulhosamente propalada pelo Senhor Secretário das Finanças arrasa agora, terra adentro, a já tão debilitada cidade da Praia da Vitória.

Como aceitar um pai gordo se em casa os filhos passam fome? Na linha do impiedoso.

- Contas certas acima de tudo! Ah, pois é! Doa mesmo a quem doer, meus amigos! Muito acima de absolutamente tudo, TUDO!, e não venham cá com histórias de famílias em profundo desespero para sobreviver! Na linha do impiedoso.

- Que se cortem despesas, e se os funcionários levam muito do orçamento, pois que se cortem, que se cortem nesses, que as cabeças rebolem!... Números, números, esses funcionáriozecos!

Há que os pôr a andar, esses malandros, oportunistas escolhidinhos a dedo pelas insanas utopias da esquerdalha socialista... CORTA-SE! Nem mais um cêntimo! A meio, se preciso for, sem mais despesismos ou salomónicos juízos... e já agora, de que céu caiu essa extravagante ideia de formações, programadores e outras coisas que tais?! PS, não?! Só podia... Agora cá, pagar formações profissionais para que se povoe a cidade. Pessoas!... Paguem, para si é!... E ainda por cima, a madraços que têm o desplante de ainda vir dizer que se despediram dos seus empregos para isso, aquele sugar sem fim de subsídios do governo regional à custa dos impostos de todos nós. Era mesmo o que mais faltava! Ide trabalhar!, seus... seus...

A vida é feita de escolhas. Nem sempre fáceis, as escolhas. Mas de que servem contas certas se as famílias têm fome? Na linha do impiedoso. Fará mesmo sentido um orçamento concelhio engolir os seus habituais apoios municipais de modo a encher seus cofres quando, na rua, ficam as pessoas sem chão para levar a vida adiante? Na linha do impiedoso.

Que a consciência não doa a quem manda, verificando-se tardio para quem obedece. Por isso. Por isso, apenas. Porque a vida se foi, entretanto, a quem perdeu o direito à oportunidade de ser feliz. Sinónimo de, para muitos, desejar uma singela oportunidade de fazer seus filhos felizes.