Opinião

Paz podre

Não é possível, por muito mais tempo, manter a acrobacia política. Só uma flexibilidade digna de uma qualquer Nadia Comäneci permite num dia defender que “o governo foi exonerado há meses pelo povo” e, ainda assim, continuar, por ação e omissão, a garantir a sua sobrevivência. Só um malabarismo inspirado na mais velha arte circense admite que se vocifere ultimatos a exigir uma remodelação e apoios à natalidade para depois, quebrados todos os prazos e falhadas todas as “promessas”, continuar o teatro de sombras para iludir uns poucos. Só mesmo no reino do folhetim político de duvidosa qualidade se pode encontrar quem sobre um líder partidário escreva que “tudo nele recorda um passado que já teve o seu tempo e que ninguém deseja reeditar neste século” para, depois, sem memória e - já agora – um pingo de coerência, gritar a plenos pulmões: “estou consigo até ao fim”, em juras de amor a fazer lembrar a “lealdade” na ponta da faca que Brutus ofereceu a Júlio César. Todos vêm, todos sentem, mas quase ninguém assume: o cheiro bafiento que empesta o atual clima político é o de uma paz podre que não adianta nada nem serve ninguém.