Opinião

Desconfinando

O surto provocado pela covid-19 que começou a assolar o Mundo desde finais do ano passado numa longínqua cidade chinesa e que, inicialmente, talvez pela distância e garantidamente pelo grande desconhecimento das repercussões do mesmo, não foi analisado e atacado com a prudência e cuidados que se imporiam. A Europa demorou tempo a mais a reagir. Na Itália ou na Espanha, por exemplo, só foram tomadas medidas musculadas relativamente ao confinamento quando a “casa já ardia”. Em Portugal, todos nos lembramos de uma declaração da Diretora Geral da Saúde, no início do ano, onde colocava em dúvida a chegada do vírus a território nacional. A América, de Trump, apressou-se a dizer que estava preparada para o “vírus chinês” e que o importante era a economia continuar a funcionar a toda a velocidade. O Brasil, de Bolsonaro, falava do vírus como uma “gripezinha” ou “resfriadinho”. A verdade é que o vírus rapidamente ganhou a dimensão de pandemia e o Mundo assistia, sem antídoto clínico eficaz, a um galopante crescimento diário de infetados e de vítimas mortais. Presentemente, à escala global, em números acumulados, caminhamos para 6 milhões de casos confirmados e temos a lamentar cerca de 360 mil óbitos. Os Estados Unidos da América lideram esta trágica lista, sendo que já ultrapassaram os 100.000 óbitos e aproximam-se dos 2 milhões de infetados. Eis, portanto, o resultado do primado da economia. Conjugado, obviamente, com um estado social que antes de cuidar faz a seguinte pergunta assassina: “tem seguro?”. Em Portugal, felizmente, a primazia foi dada à saúde pública. E mesmo assim registam-se, à data que escrevo, cerca de 32 mil casos confirmados e, infelizmente, 1369 óbitos que muito se lamenta. Estes números, incomparavelmente melhores do que qualquer um dos vizinhos europeus, só foram possíveis com a abnegação e disciplina da esmagadora maioria do povo português. O pedido era simples. E foi-nos dito através de uma palavra (confinamento) pouco familiar. E que, rapidamente, passou ao “fiquem em casa”. Essa era a receita para evitar uma descontrolada propagação, cuja consequência para o Serviço Nacional de Saúde seria dramática. Isto mesmo resulta de um estudo da Escola Nacional de Saúde Pública recentemente divulgado e onde resulta espelhado que o confinamento não só salvou vidas como evitou o colapso das unidades de cuidados intensivos dos hospitais. Este estudo devia ser de leitura obrigatória para os “especialistas” que acusam as autoridades, nacionais e regionais, de alarmismo e exagero nas medidas impostas. Defender a saúde pública é a primeira obrigação de qualquer governante. Primeiro a saúde, depois a economia. Nos Açores, felizmente, procurou-se cumprir esta regra fundamental. Agora, é tempo de ir desconfinando. A vida, aos poucos, vai voltando à normalidade. À nova normalidade. De máscara e com um prudente distanciamento físico. Os próximos tempos terão, em nome da saúde de todos nós, de ser assim. Só com a colaboração e compreensão de todos é que será possível ultrapassar, em definitivo, este gigantesco obstáculo. Vamos a isso!