Opinião

A Constituição e as quarentenas

Mais cedo ou mais tarde vamos querer voltar à normalidade, falar cara a cara com os amigos, passear com as crianças, descansar nos bancos dos jardins, respirar livremente o ar que nos rodeia, tomar um banho nas águas tépidas do Atlântico, entre outros prazeres que a vida nos oferece. Queremos e haveremos de conseguir voltar a ter estes momentos, muito provavelmente pouco valorizados no passado recente porque eram dados como adquiridos. Vamos chegar lá, mas para isso temos de avançar com precaução, cumprir regras que a nova situação determina e presumindo sempre que este vírus, que nos condiciona tanto, anda por aí e está à espreita de um momento de fraqueza para nos atacar de novo. Nestas grandes crises, porque é disso que se trata, sobressaem a resiliência das populações, a capacidade de adaptação e alguma imaginação para superar as dificuldades resultantes dos inéditos confinamento e afastamento social. Mas também é nestes tempos de dificuldade que se confirmam as grandes lideranças que, com coragem e determinação, fazem a gestão de uma crise sanitária implementando medidas duras, é certo, mas sempre tendo como objetivo proteger os Açorianos. Não conheço decisões do Presidente Vasco Cordeiro, sobre questões de saúde pública, que não tenham merecido um amplo apoio da população que, neste período, mais do que luta partidária, necessita de ações no sentido de a proteger. Neste momento a situação epidemiológica parece estar a ficar controlada, com algumas ilhas sem casos, outras a reduzir o seu número e ainda com a extinção de cadeias de transmissão. No entanto não podemos baixar a guarda e por isso o Governo dos Açores decidiu, e a meu ver decidiu muito bem, manter as quarentenas obrigatórias à chegada aos Açores. Esta decisão, para além do controlo sanitário que se exige em tempo de pandemia, também desencoraja os residentes e os não residentes de viajar de fora da Região quando não tenham necessidades prementes que o justifiquem. Surgem agora, a este propósito, dúvidas relativamente à constitucionalidade desta decisão e a apresentação da respetiva queixa na Provedoria da Justiça por um ex-deputado do PSD e atual membro do Conselho Regional daquele partido, Pedro Gomes, argumentando que a liberdade de circulação dos cidadãos está, por esta via, posta em causa. A interpretação da Constituição é sempre difícil e discutível, mas creio que a interrupção da circulação por apenas catorze dias, por razões excecionais provocadas pela pandemia Covid-19, não se pode sobrepor ao direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover, norma também inscrita na Constituição Portuguesa. E como a saúde é um bem maior, é um valor primeiro, é um direito de cidadania, tem de estar sempre no centro das políticas públicas e é por isso que o Governo dos Açores está, mais uma vez, a decidir com determinação no sentido de defender e proteger o Povo Açoriano.