Opinião

Os eleitores gostam mesmo da “geringonça”?

Ao longo dos últimos 4 anos fomos, insistentemente, inundados com uma espécie de apologia da geringonça. A fórmula política encontrada para “apear” a dupla Passos Coelho e Paulo Portas não só punha termo ao denominado arco da governação (território pertencente ao PS, PSD e CDS-PP), como principalmente incutia responsabilidade a quem até então apenas se assumia como oposição. Oposição ao poder. Independentemente de ser o PS ou o PSD o inquilino do Terreiro do Paço. A palavra de ordem era simples e de uma (in)coerência extrema: contra. Contra, sempre! Ora, como sabemos, sempre significa… até um dia. E assim foi. Na noite de 4 de outubro de 2015 Jerónimo de Sousa, surpreendentemente, diz algo como: “O PS só não será governo se não quiser…” Os comentadores e analistas políticos, meio atónitos, começaram a fazer análises, prognósticos e contas. O ceticismo reinava. Uns falavam em impossibilidade quase total de conciliação. Outros anunciavam a morte à nascença desta ideia. A verdade é que Passos Coelho viu o seu programa de governo ser rejeitado e, uns dias depois, António Costa já estava em plenas funções. Por esta altura, não só se teciam loas à mestria de Costa, como esta inovadora cartada era comentada utilizando expressões como “derrubar muros”; “fazer história”; “verdadeira democratização do sistema partidário”; “dar sentido à eleição de deputados”, etc… Ora, no passado dia 6, os eleitores (infelizmente apenas 55%!!) pronunciaram-se também sobre a “geringonça”. E o que disseram nas urnas? Em primeiro lugar, deram a vitória ao PS. O PS ganhou em 15 dos 20 círculos eleitorais existentes no território nacional (em 2015 havia vencido em 7). O PS cresceu em número de votos (mais 125 mil face às eleições de 2015). O PS cresceu em número de mandatos (mais 21 – faltando ainda atribuir 4 mandatos). Em síntese, os eleitores permitiram ao PS crescer 4,3% face às legislativas anteriores, obtendo agora 36,7%, o que corresponde à obtenção de 106 mandatos. Em segundo lugar, os eleitores disseram nas urnas que o BE (versão social democrata?) não justificava mais do que o número de mandatos que já tinha (19), sendo que na contagem dos votos regista-se agora menos 50 mil face a 2015. Em terceiro lugar, os eleitores decidiram penalizar fortemente a CDU (coligação que congrega o PCP e Os Verdes), cujos 2% de perda de base eleitoral se traduzem em menos 115 mil votos e, consequentemente, na perda de 5 mandatos. Em quarto e último lugar impõe-se uma referência ao PAN - ainda que não tenha ficado na foto dos acordos de incidência parlamentar, mas pela postura quase sempre alinhada com a maioria de esquerda – que cresceu e muito (mais do que duplicou o número de votos e quadruplicou os mandados). Foi, objetivamente, o segundo grande vencedor da noite eleitoral. Para terminar, cumpre referir que o apuramento dos votos depositados nas urnas e acima elencados dá a resposta à nossa inquietante pergunta. Ou melhor, dá-nos um conjunto de factos (números). Mas como dizia Friedrich Nietzsche: “Não há factos, apenas interpretações.”