Opinião

Na corrente atlântica de parcerias

A semana que agora termina ficou marcada pela realização de dois eventos que são da maior importância para os Açores. A III reunião da Comissão do Mar dos Sargaços e o encontro de alto nível para a criação do Air - Centro de Investigação Internacional dos Açores, que tiveram lugar no Faial e na Terceira respetivamente. Estas ações, que se intersetam, reforçam a centralidade estratégica do nosso arquipélago, valorizando e impulsionando a nossa produção cientifica. Ambos os eventos são o corolário de um trabalho que vem desde há muito a ser realizado. Merecem, a este propósito, destaque, desde logo, a “Declaração de Hamilton”, desenvolvida no âmbito da Aliança do Mar dos Sargaços, precursora na criação de uma área marinha protegida em mar aberto e que tem como signatários as Bermudas, o Reino Unido, o Principado do Mónaco, os Estados Unidos da América, o Canadá, as Ilhas Caimão e os Açores. Esta Declaração dá corpo ao entendimento, felizmente cada vez mais pacifico, de que os impactos da atividade humana na componente marinha do planeta devem ser enfrentados independentemente da tradicional divisão de fronteiras políticas. Constitui, também em virtude da sua abrangência geográfica, um poderoso instrumento no desenvolvimento da cooperação transregional, transacional e transoceânica. Dá, no fundo, passos significativos rumo ao grande desafio da Lei do Mar dos tempos que correm que é o de nos munirmos de um instrumento internacional juridicamente vinculativo que regule a conservação e a utilização sustentável da biodiversidade marinha nas Áreas Fora de Jurisdição Nacional. A outra iniciativa que destaco é a “Declaração de Galway” que define formalmente os esforços coordenados dos governos norte-americano, canadiano e da União Europeia para o aumento do conhecimento no oceano Atlântico. Como consequência desse compromisso de alto nível, estão a ser desenvolvidos vários projetos de recolha e investigação de dados oceanográficos. Este foi um passo visionário que está mobilizando equipas em ambos os lados do Atlântico Norte, criando entusiasmo entre cientistas e partes interessadas. Estamos construindo pontes. A visão da “Declaração de Galway” que agora também é compartilhada pelo Brasil e pela África do Sul está a promover o diálogo cientifico entre o Norte e o Sul. No próximo mês de Julho, um encontro de alto nível em Lisboa, transformará a “Declaração de Galway” na “Declaração de Belém”, ficando assim formalmente alargado ao Atlântico Sul a estratégia para o desenvolvimento do conhecimento do Atlântico. O Air - Centro de Investigação Internacional dos Açores enquadra-se também neste contexto do desenvolvimento científico para o Atlântico e assenta num enorme entrosamento da cooperação Norte-Sul e Sul-Norte. Como exemplo, de como isto pode ser impulsionado e as bases que já existem, recuo ao ano de 2003. Naquela altura, uma oceanógrafa da Universidade dos Açores, a cientista Manuela Juliano, ao analisar grandes conjuntos de dados, identificou uma nova corrente e frente Oceânica no Atlântico Sul, espelho da largamente conhecida Corrente /Frente dos Açores. Eis como uma investigadora a partir do arquipélago dos Açores, conseguiu identificar a chamada “Corrente de Santa Helena”, algo que acontece longe daqui e que, ainda que de forma simbólica, demonstra que esta cooperação Norte-Sul e Sul-Norte faz sentido. O Centro Air poderá ser um marco histórico, um pilar central para a cooperação científica e industrial que é fundamental para o avanço da ciência e para o aconselhamento estratégico, fatores decisivos para o sucesso de uma agenda de empreendedorismo azul sustentável, geradora de crescimento e de empregos azuis.