Opinião

Por uma Autonomia de envolvimento

I. A Autonomia, enquanto sistema de auto governo, tem sido um instrumento fundamental de progresso e desenvolvimento económico-social. Administrar um território tão específico de forma próxima, recorrendo à experiência daqui ter nascido na esteira de gerações e gerações de clamores ignorados e de justas pretensões desconsideradas, permitiu-nos recuperar em termos infraestruturais de um atraso de séculos e convergir económica e socialmente, em articulação (por vezes relutante) com os poderes central e europeu. Mas a Autonomia não é só isso – e já seria bastante, se fosse só isso. A proximidade inerente ao poder autonómico encerra também um potencial enorme no que diz respeito ao envolvimento das pessoas na prossecução do bem comum. A escala intimista de uma Região de 250 mil almas (mais coisa menos coisa) que se auto governa tem de permitir também que as coisas da governação sejam desígnios de todos, contíguos à vivência diárias das comunidades e das famílias. Desse ponto de vista, a Autonomia tem de ser também o resultado do esforço de cada um em prol de todos. Há, pois, um encargo especial dos poderes autonómicos em termos de participação e envolvimento cívico e político. Não precisamos de fazer como os outros fazem, nem temos de sofrer os males de que os outros sofrem. Temos, pelo menos, de fazer um esforço para, refletindo de forma ampla e empenhada, tentar conseguir mais do que os outros conseguiram. II. Há quem queira fazer crer que a chave para melhorar a taxa de envolvimento do sistema está na passagem de 57 deputados para 23 (ou 30, ou 17, ou escolha o leitor o número que lhe parecer mais adequado…), como se a representatividade e a proporcionalidade entre ilhas fosse uma excentricidade do tempo em que (supostamente) havia dinheiro e agora, em tempos de recuperação da crise, se tivesse tornado num insustentável insulto ao discurso “quanto-custa?” dominante. Há também, por outro lado, quem queira, intencionalmente, confundir a questão com um mero rearranjo orgânico e institucional. E há ainda quem só queira ver a componente de afirmação externa – muito relevante, é certo – da causa autonómica, sem lhe juntar o trabalho interno de implicação de todos no nosso futuro coletivo. Do que falamos aqui é de uma Autonomia de resultados também ao nível da capacidade do sistema para abarcar novas formas de participação cívica, para ser capaz de responder àqueles que não se sentem representados, para encontrar maneira de se fortalecer na sua constante renovação. Do que falamos aqui é de uma Autonomia pensada estruturalmente, e não em função de interesses conjunturais, sejam de que ordem forem, uma Autonomia para além do jogo de forças político e social de cada momento. III. A capacidade de nos organizarmos coletivamente deve ser usada para encararmos a “nossa” abstenção como um problema “nosso”, para não nos limitarmos a medir a nossa eficácia por padrões comparados de desenvolvimento socioeconómico e para, ousando criar e recriar, procurarmos formas originais de responder à nossa circunstância e à sua evolução. Os outros que teimam em não nos compreender terão muito mais facilidade em desmerecer-nos se formos apenas indicadores estatísticos sem gente dentro e se a nossa voz for apenas a voz de poderes que deixaram de representar a alma destas ilhas. André Bradford