No discurso do "Estado da União" desta semana, Ursula von der Leyen falou de "urgência" e "unidade". Mas a verdade é que o discurso foi o espelho da desunião que hoje domina a União Europeia: uma Europa incapaz de se unir para condenar veementemente Israel, para responder à Administração dos EUA e, sobretudo, para dar respostas à realidade dos cidadãos e aos dramas que se vivem nas diferentes geografias do nosso continente.
De resto, um dos aspetos que mais tem fragilizado a liderança da Presidente Von der Leyen é precisamente a distância entre as suas palavras e a ação da sua Comissão, razão pela qual se avizinham já mais duas moções de censura futuras ao seu "governo".
Genocídio em Gaza: tarde e insuficiente
A suspensão do acordo de associação com Israel, finalmente anunciada, e reclamada há muitos meses, chega demasiado tarde. E a proposta de um plano de reconstrução para Gaza é insuficiente se, ao mesmo tempo, não formos capazes de parar a destruição contínua levada a cabo por Israel.
A UE tem a obrigação moral e política de defender o direito internacional, proteger as vidas dos palestinianos e usar todos os instrumentos diplomáticos e económicos à sua disposição. Sem isso, os nossos valores não passam de retórica.
Acordo comercial com os EUA: afinal quem defende os agricultores?
Aceitar tarifas de 15% impostas pela Administração dos EUA, sem qualquer medida de resposta, é inaceitável. Esta decisão penaliza os agricultores europeus, enfraquece a nossa competitividade e envia um sinal perigoso de fraqueza ao resto do mundo. É imperativo que, tal como está acontecer com o acordo do Mercosul, a Comissão defenda perante os EUA os seus produtores, garantindo condições justas e equilibradas.
Clima: desistir não é opção
A mesma Comissão que apresentou o Pacto Ecológico Europeu parece agora ter desistido dele. Mas o Ambiente não é ideologia - é sobrevivência, competitividade, autonomia estratégica e justiça climática.
A transição ecológica deve ser acelerada, não travada. Sem um plano robusto e ambicioso, a Europa arrisca a ver-se com eventos climáticos - como os fogos - cada vez mais drásticos, perder a liderança global na luta contra as alterações climáticas e comprometer a vida das gerações presentes e futuras.
Alguns sinais positivos
Num discurso que é necessariamente de grande alcance temático, a crítica não pode também ser toda negativa. Por isso, assinalo como positivo que a Presidente da Comissão tenha finalmente reconhecido a urgência de um Plano Europeu para a Habitação Acessível, incluindo a revisão das regras de auxílios de Estado para a construção, algo que os socialistas na Europa defendem há muito, quando outros diziam ser impossível.
Também foi anunciada a elaboração de uma nova Estratégia Europeia de Combate à Pobreza e propostas para enfrentar o aumento do custo de vida, fundamentais para devolver dignidade a milhões de europeus. E na agricultura, saúdo a decisão de reforçar o orçamento da UE para a promoção dos produtos agrícolas, através da campanha "Compre alimentos europeus", uma medida que valoriza os nossos agricultores e incentiva o consumo de produtos locais e sustentáveis.
A grande ausência: Orçamento e ambição
Talvez o silêncio mais ensurdecedor tenha sido sobre o orçamento da União Europeia. Perante uma proposta orçamental para 2028-2037 que representa um retrocesso face às reais necessidades da UE, a Presidente não apresentou nenhuma visão sobre os recursos financeiros indispensáveis para enfrentar os desafios globais que temos pela frente e sem um orçamento robusto, todas as promessas arriscam a ficar no papel.