Opinião

Lapsus memoriae

Em grande parte dos processos de “averiguação da paternidade”, em política, reside latente a recusa de alguém em assumir que é pai (quando “a coisa” não corre bem - são os processos mais dolorosos)e muito frequentes são os processos em que dois (ou mais) pais dizem “a criança” é sua (quando “a coisa” corre muito bem – são os processos “salomónicos” onde, na generalidade, o Salomão é uma opinião pública bem informada). Nos últimos dias temos assistido a uma situação, claramente fomentada pelo período eleitoral em que nos encontramos, que já não levanta sobrancelhas a ninguém mas que, para bem do esclarecimento, vale sempre a pena, sobre ela, recordar alguns factos. Passos Coelho achou que vinha “dar uma ajuda” a um PSD/A (completamente desnorteado) quando se deslocou aos Açores para afirmar que foi ele que havia persuadido o Governo Regional dos Açores a adotar o novo modelo de transporte aéreo e que na altura este estava mais focado em remunerar mais as obrigações de serviço público. Trazer a cara das políticas de austeridade aos Açores para, de forma deliberada, tentar (novamente) induzir os Açorianos em erro, já roça o desespero. Por diversas vezes já foi explanado publicamente que a proposta do Governo dos Açores de revisão das Obrigações de Serviço Público para as ligações aéreas entre os Açores e o exterior não tinha como pressuposto um aumento dos encargos do Estado com esse serviço público. Em boa verdade, a condição do não aumento dos encargos para o Estado foi transmitida, em agosto de 2011, por Vasco Cordeiro, como Secretário Regional da Economia, ao então Ministro da Economia e Emprego, Álvaro Santos Pereira. Aquele pressuposto foi reafirmado expressa e publicamente na apresentação da proposta de revisão das OSP, em maio de 2012, pela então Secretária Regional da Economia, Luísa Schanderl. Em janeiro de 2014, Vítor Fraga voltou a afirmar o mesmo, em reunião com os então Ministro da Economia e Secretário de Estado das Obras Públicas. Em outubro de 2014, Vasco Cordeiro reafirmou a mesma intenção a Passos Coelho, em reunião em Ponta Delgada. Passos Coelho parece não ter (convenientemente) memória nenhuma. Arranjem a este homem, para bem da manutenção de algum bom senso, um elefante daqueles que andam atrás do senhor do multibanco. O PS Açores, por sua vez, sempre foi contra um modelo de liberalização de espaço aéreo que não protegesse os residentes e os estudantes. Liberalizações totais, sem quaisquer tipos de regras, nunca seria o melhor para os Açores. Na retina, em todos os debates que se realizaram antes da adoção do atual modelo, estava sempre o que se havia passado na Região Autónoma da Madeira, onde as tarifas chegavam a preços exorbitantes em épocas sensíveis, em muito prejudicando, por exemplo, os estudantes que queriam voltar a casa em tempo de férias. Na memória estavam os debates na Assembleia Legislativa da Madeira onde até os deputados do PSD Madeira reclamavam porque a liberalização total não servia os interesses daquela Região Autónoma. Não queríamos esse modelo para os Açores. Aqui teria que ser diferente. Foi com muito cuidado, dedicação e tendo em vista os interesses dos Açorianos que o nosso Governo Regional – não o PSD/Açores – negociou o atual modelo. O PSD pode não ser – e não é! - o pai do novo modelo de transporte aéreo. Mas já que tem tanto amor à criança, pode sempre assumir um outro qualquer papel – um tio dos que só aparecem no Natal, vá lá. Neste caso, “pai” sabemos quem é e quem sempre agiu como tal – foi quem nunca teve necessidade de convencer os açorianos desse facto porque ele sempre foi bem claro e notório.