Opinião

UExit!

Olhando para a fita do tempo, com algum distanciamento, o curso da história em cada início de século - com convulsões sociais, com crescimento dos extremos políticos populistas e intolerantes e com o aparecimento de tensões secessionistas nos países ocidentais - parece querer, inevitavelmente, repetir-se. Não falo especificamente das guerras do primeiro quartel do século XX, mas, refiro-me, sobretudo a todo o processo de convulsão social e económica que as originou. Sim, para os que ainda não perceberam, estamos mesmo a vivenciar história. História má, provavelmente, - em tudo semelhante aquela que estudamos nos livros da escola sobre acontecimentos que mudaram o mundo noutros tempos – com consequências ainda não previsíveis, no futuro das nações, mas sobretudo, nas nossas vidas. Se analisarmos a decisão de 51,9% dos cidadãos britânicos de abandonar a União Europeia, ao pormenor, não podemos deixar de ficar um pouco espantados com o significado dessa opção: - Mais de metade dos votantes optaram pelo caminho do nacionalismo, pela não partilha de soberania, acharam que o caminho do Reino Unido era melhor se fosse feito sozinho, do que acompanhado pelos seus parceiros europeus; Consideraram que os 350 milhões de libras – número falso avançado e dado como verdadeiro pelos partidários do Brexit, o real é 190M£ - que o Reino Unido injetava por semana no orçamento europeu seria melhor investido diretamente na economia e nos serviços do Estado; Os britânicos não aceitaram a ausência de legitimidade democrática das instituições europeias, nomeadamente, de um diretório de países liderado pela Alemanha, que pode decidir sobre o destino de um país e da vida de um povo sem prestar contas a ninguém. Temos a tendência para desvalorizar certos atos das nossas lideranças, mas a decisão do Conselho Europeu, liderado pela Alemanha em aplicar mais austeridade à Grécia, contra a vontade do então recém-eleito governo, teve e tem consequências, nomeadamente, na forma como os britânicos observavam o processo de decisão na União Europeia; Finalmente, e talvez o aspeto mais importante, na decisão do Brexit foi o total falhanço das instituições europeias e das lideranças políticas na gestão da crise dos refugiados, o que abriu caminho - curiosamente num país com uma taxa de desemprego na ordem dos 5% - aos sentimentos mais primários de xenofobismo e racismo. As lideranças políticas europeias preferiram olhar para o seu “umbigo nacional” em detrimento do aprofundamento democrático da União Europeia. Diariamente, muitos cidadãos europeus, como os portugueses ou os gregos, sentem-se reféns das decisões e da generosidade dos países mais ricos para que o seu país funcione e a economia gere emprego. Outros cidadãos europeus assistem, diariamente, a líderes fracos e demagogos a justificarem os seus insucessos com a solidariedade prestada e devida a outros países. Numa Europa contruída na base da solidariedade entre iguais todo este caminho mais recente percorrido foi no sentido da desunião. E avaliando as mais recentes reações ao Brexit, da parte dos dirigentes europeus, parece que não aprendemos a lição! A solução não é castigar o Reino Unido pela sua decisão ou reunirem pequenos diretórios de países da União Europeia para decidir o que fazer. Este é o caminho errado! A solução é aprofundar o projeto europeu com base na solidariedade recíproca entre países e reformar o processo de decisão para que este seja mais democrático e próximo das populações. O outro caminho, alternativo já conhecemos, é o da secessão, o da intolerância apregoada pelos extremos políticos. Dúvidas sobre as consequências? Basta rever a história do início do século XX.