Opinião

Oportunismo, miséria e esperança

I. Responsabilidade vs oportunismo

A semana, em Estrasburgo, foi marcada pela moção de censura à Comissão Europeia presidida por Ursula von der Leyen. Um ano após o início do mandato, este momento expõe os limites de uma estratégia política errática, não apenas da Presidente da Comissão, mas também do PPE (grupo político do PSD) que, em muitas matérias, alinha e até mimetiza o discurso da direita radical.
O chumbo da moção de censura apresentada pela extrema-direita deve-se ao sentido de responsabilidade dos grupos moderados, com destaque para os socialistas e democratas, mas também para os verdes e os liberais. Consentir a sua aprovação seria lançar a União Europeia numa crise profunda, com custos elevados para a estabilidade económica e até para a segurança de milhões de europeus.
Contudo, não podemos ignorar que a própria Comissão e o percurso ziguezagueante do PPE, que nuns dias alinha com a plataforma moderada e noutros atira-se sofregamente para os braços da extrema-direita, criaram o terreno fértil para este oportunismo pantanoso.
Mas, a linha entre responsabilidade e oportunismo não se limita às instituições europeias. O mesmo acontece na República e aqui nos Açores, onde, a troco da manutenção no poder, se remete, sem pudor ou remoque, a social-democracia ao esquecimento.


II. Miséria moral...
Expor nomes de crianças e, pior, usá-los como armas de arremesso político não é (só) uma questão política. É mesmo absoluta falta de decência! O recente episódio protagonizado por André Ventura na Assembleia da República, em que divulga uma lista com nomes de crianças de uma escola pública em Lisboa para sustentar uma alegada "mudança civilizacional", é revelador sobre quem, com esse comportamento, acha que vale tudo no combate político. Mas, o problema não está só na indecência de Ventura. Está, também, naqueles que, na maioria das vezes, optam por relativizar e até desculpar atitudes e condutas de Ventura que criticariam noutros interlocutores políticos e, decerto, não aceitariam se fossem dirigidos a si ou aos "seus". E aqui reside uma das misérias morais do nosso tempo: a de consentir, aceitar e até defender para os outros o mal que não queremos para nós.

III. Eles mandam em tudo, mas...
A saída do PSD, na mesma semana, de Rubina Berardo, ex-deputada à Assembleia da República, e de Inês Mota Batista, fundadora da plataforma Social Democracia no Feminino, é, simultaneamente, sinal de alerta e de esperança. De alerta porque quando figuras de gerações distintas rompem publicamente com o partido por sentirem que este já não representa um espaço de liberdade e social-democrata, algo está mesmo muito mal. De esperança porque, apesar de tudo, estas saídas ocorrem numa fase em que o PSD, encostado mais à direita do que nunca, está no poder nos dois governos regionais, no governo da república e, no plano europeu, a sua família política é maioritária na Comissão Europeia e no Conselho Europeu. Também por isso, vozes como a de Rubina e Inês são necessárias, não pelo desconforto que causam, mas pelo exemplo que dão.