Opinião

Um (des)Governo de Tachos e Taxas

A Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei n.º 48/90, de 24 de agosto, com as sucessivas alterações introduzidas, prevê na base 24 a existência de taxas moderadoras, as quais constituem fontes de receita própria das instituições e serviços do Serviço Regional de Saúde.
A introdução da comparticipação do utente no preço dos serviços prestados pelas unidades de saúde teve como principal objetivo a moderação na procura pelos serviços de saúde apresentando-se como uma estratégia para combater a má utilização e promover a otimização dos recursos.
No entanto, durante o Governo de Pedro Passos Coelho, o efeito moderador das taxas moderadoras foi enviesado passando para um efeito financiador do Sistema de Saúde.
Recorde-se que foi Pedro Passos Coelho, então Primeiro-Ministro, que afirmou em dezembro de 2011 que o objetivo do seu Governo de então era que as taxas moderadoras pudessem "realmente dar um contributo maior para o financiamento também do sistema de saúde".
O Estatuto do Serviço Regional de Saúde na sua mais recente redação e quarta alteração datada de 2020, já demonstrou o entendimento de que as taxas moderadoras se constituem como uma forma de copagamento que transfere para o utente um encargo adicional na utilização dos serviços de saúde, representando, assim, mais uma despesa no orçamento familiar, podendo revestir-se como um obstáculo na acessibilidade aos cuidados de saúde.
Com a referida redação, alteração e consequente republicação foi dado um passo com vista à eliminação de todas as taxas moderadoras num futuro próximo pelo que atenta a conjuntura Pandémica atual (e esperamos o mais rapidamente possível Pós-Pandémica) bem como o conhecimento adquirido pela população da devida e necessária utilização dos recursos do Serviço Regional de Saúde, onde se deve inserir a Linha de Saúde Açores, entende-se que é chegado o momento de aprofundar o disposto na Lei de Bases da Saúde relativamente às taxas moderadoras.
A isto acresce a iniciativa do Governo da República que altera o regime de cobrança de taxas moderadoras no Serviço Nacional de Saúde, prevendo que a cobrança de taxas moderadoras acabará em todos os serviços do Serviço Nacional de Saúde, mantendo-se apenas em serviço de atendimento de urgência hospitalar, exceto quando exista referenciação prévia pelo Serviço Nacional de Saúde ou admissão a internamento através da urgência, iniciativa esta já materializada no Decreto- Lei n.º 37/2022, publicado no passado dia 27 de maio.
Posto isto, justifica-se perfeitamente que também na Região se aprove semelhante regime com urgência para que os utentes da Região não estejam em condição de desvantagem no acesso ao Serviço Regional de Saúde em relação ao acesso ao Serviço Nacional de Saúde em território continental.
Exceção feita aos Cuidados de Saúde Primários, atualmente na Região são pagas taxas moderadoras nas consultas, atos complementares prescritos e outras prestações de saúde se o utente não for referenciado pelo Serviço Regional de Saúde ou pelo Serviço Nacional de Saúde e no atendimento nas unidades básicas de urgência das unidades de saúde de ilha e nos serviços de urgência dos hospitais.
Assim, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista dos Açores (GPPS/A) apresentou um Projeto de Decreto Legislativo Regional que introduz a quinta alteração ao Estatuto do Serviço Regional de Saúde dos Açores de modo a dispensar o pagamento de taxas moderadoras no âmbito da prestação de cuidados de saúde, mantendo-se apenas nos serviços de atendimento realizado nas unidades básicas de urgência das unidades de saúde de ilha e nos serviços de urgência hospitalares, não se aplicando o pagamento destas taxas quando exista referenciação prévia comprovada pela Linha de Saúde Açores, pelo Serviço Regional de Saúde/ Serviço Nacional de Saúde ou nas admissões para internamento através da urgência.
Para tal foi utilizada a figura da urgência na apreciação da iniciativa em comissão, para que pudesse subir na sessão plenária de julho, resultado da impossibilidade que advém da regra constitucional (vulgo lei travão) que inibe o exercício de iniciativa legislativa, aos deputados e grupos e representações parlamentares, durante o período de execução orçamental, que possa retirar receita ou adicionar despesa.
Sendo este um dos casos e estando todos os parlamentares inibidos de iniciativa, a única forma de permitir que esta medida possa entrar em vigor antes de janeiro de 2023 é existir uma iniciativa do Governo Regional, o que até hoje não se verificou, apesar de o Governo se encontrar desde o início de maio a... refletir sobre o assunto.
Assim, o GPPS/A desafiou o Governo Regional a ter uma iniciativa legislativa sobre esta matéria até julho de modo a discutir em conjunto os diplomas e a que se implemente nos Açores um regime de pagamento de taxas moderadoras em igualdade com o território continental.
Mas nada feito.
Tanto o Governo como os partidos da coligação recusaram a apreciação conjunta e urgente desta matéria de modo que pudesse ser aprovada na sessão plenária de julho.
Ficamos a saber que este Governo é contra a taxa turística, mas a favor de continuar a taxar o acesso à saúde dos Açorianos.
É um Governo que não tem urgência em encontrar soluções para o acesso à saúde dos Açorianos (desde abril que se aguarda por um plano de recuperação da atividade assistencial) nem em melhorar as condições de vida da população que governa, mas é célere em exonerar e nomear para cargos de modo a solucionar os interesses e desejos dos seus companheiros de coligação.
No fundo um Governo que traz memória e práticas de um PPD que não mereceu a confiança dos eleitores.
Um (des)Governo de tachos e taxas.