Opinião

Governar de costas voltadas

Gerir um sistema de saúde não é fácil.
Pela sua vertente sistémica o sucesso da atividade assistencial desenvolvida pelo mesmo carece de um funcionamento articulado entre unidades e profissionais de saúde.
Ao longo dos últimos meses são preocupantes os sinais e sintomas de que o sistema funciona cada vez mais desarticuladamente, com unidades de saúde de ilha, hospitais e profissionais de saúde funcionando de forma isolada com a agravante da entropia que pode ser causada pela primeira e única unidade hospitalar da Região.
O Governo Regional tem potenciado essa desarticulação ao longo dos últimos meses não ouvindo os apelos de gestores, profissionais de saúde e sobretudo de utentes.
Exemplo recente tivemo-lo, novamente, quando o Secretário Regional da Saúde e Desporto esteve numa cerimónia no Hospital do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada e "cantando" a uma única e só voz, disse o que queria dizer e não ouvir o que se tinha para lhe dizer.
Com a contestação a subir no Hospital do Divino Espírito Santo de Ponta Delgada, com impacto crescente na atividade assistencial e que os próprios utentes já começam a evidenciar, os profissionais que já há meses haviam manifestado as suas preocupações não foram tidos nem achados na referida visita comemorativa continuando, este Governo, com a sua atuação na base do monólogo e da procura pela responsabilização de outros por via da abertura ao desbarato de processos de inquérito dos quais nunca se conhecem conclusões.
Do maior orçamento de sempre no setor da saúde não se evidenciamresultados.
Anunciam-se contratações, mas não se vislumbra sequer a abertura de procedimentos concursais. A aposta tem passado pelas prestações de serviços. De conhecidos que vêm de fora e passam cá uns dias e depois vão embora. Há uns meses atrás, havia quem os chamasse de "mercenários" por virem à Região trabalhar menos e ganhar mais que os outros...
Da propalada inversão de paradigma nada se vê.
Assiste-se sim, a um Governo "amigo dos seus amigos".
Nisso, José Manuel Bolieiro foi claro e transparente. Já o havia assumido na campanha eleitoral. Iria ser um "Presidente Amigo".
É o que se tem assistido e que ganhou proporções indecorosas com as Agendas Mobilizadoras.
Mas na Saúde também.
Apesar de depender de si, o Secretário da Saúde não estipula datas para conclusão dos processos e mais recentemente desacredita os serviços inspetivos, não os reforçando com pessoal necessário e anuncia a abertura de mais um processo de inquérito ao ocorrido no serviço de Oncologia do Hospital de Ponta Delgada, desta feita com recurso a "investigadores externos"...
Mais um "grupo de amigos" que virá por aí e que se juntará à Comissão Especial de Acompanhamentoda Luta Contra a Pandemia de COVID-19, ao Coordenador do processo de vacinação, à Especialista em Comunicação...
Enfim... Dizem que a amizade é uma coisa linda...
Numa Região arquipelágica a aposta na inovação, informatização e digitalização na saúde é fundamental.
Contudo, este Governo deitou tudo a perder quando, no âmbito das Agendas Mobilizadoras, deixou os três hospitais de fora e centrou a sua atenção no hospital privado da ilha de São Miguel, passando ao lado da oportunidade de modernizar estruturas e potenciar a telesaúde na Região.
Ainda se procura vender a "estaca zero" anunciada por José Manuel Bolieiro.
Mas já sabemos, apesar de isso não passar corretamente para fora, que essa estaca zero é uma falácia.
A oportunidade da inovação empresarial esfumou-se sem este Governo esclarecer o que se passou e o que se irá passar.
E no momento em que vivemos, quando passamos as "passas do Algarve" com a deficiente gestão da Pandemia que este Governo trouxe, nomeadamente, na ilha de São Miguel, quando a recuperação socioeconómica se impõe e quando na saúde a necessidade de uma estratégia e de um plano de recuperação da atividade assistencial bem como de um Plano Regional de Saúde é reclamada há meses, não se obtém resposta.
Pior.
O que vemos são membros do Governo e o próprio Presidente do Governo desarticulados entre si, a não darem a cara nos debates, a não darem a cara junto de profissionais, a não darem a cara junto de utentes, a não darem a cara junto da população e assumir a responsabilidade que é única e exclusivamente sua.
Temos assim, um Governo de costas voltadas.