Opinião

Abre a cesta e toca a flauta!

Afinal de contas, vim depois a saber que a flauta toca para encantar a audiência e não a cobra. Ora toma lá mais esta. Pois. Nem tudo é o que parece, mas isso, na verdade, já nem há quem não o saiba. Ao que parece, até é surda, a pobre, e apenas sente as vibrações. Quando a cesta se abre, ela então ergue-se lá do escuro, pois claro, e só tem olhos para aquele objeto semi-ameaçador, assim como que apontado na sua direção, mexendo-se muito lentamente e sem parar, sem parar, sem parar, tal e qual como por cá se diz, devagarinho e sempre. Ora aí está. É mesmo assim que funciona. E tu e eu, ali no meio da multidão, absolutamente convencidos de que aquela víbora (e não é víbora, isso eu sei) se encontra mesmo e absolutamente em estado profundo de hipnose, essa velhaca... e agora?! Olha, e agora é mentira!... Que queres que diga?! Hipnotizados estamos nós, e não a cobra. E muitas vezes, em muitos dias. Ouvimo-los a falar, a falar, a falar, às tantas só temos olhos para a articulação lenta dos lábios ou das mãos, já ninguém ouve o que diz, já nem a cobra, e a plateia hipnotizada, hipnotizada, hipnotizada, eu incluído. Gosto mais se o governante for direto, em que direto é quando fala sem rodeios. Isso sim, é ser direto. Ser direto não é dizer que se é direto no início da explicação e depois voltarmos ao mesmo, ao mesmo, ao mesmo, quero eu dizer, e a plateia inebriada. Ser direto é mais honesto. Pois se tem pouco para dizer, que diga pouco, ótimo, eu até julgo que agrada mais e dá mais votos, mas quando puxam da flauta, minha nossa senhora, já ninguém pode ouvir. A não ser o próprio, talvez, o próprio sim. Dei conta disso. Reparo mesmo, muitas vezes, que o próprio sim. Que já nem sabe o que dizer, que já nem sabe o que já disse, mas parar é que não para, mas explicar é que não explica. E bumba, e bumba, e bumba catrapumba, mas focar-se em responder é que é pior. Ele há coisa mais infame...? Que coisa mais irritante! E, portanto, é este o filme...fica a malta hipnotizada. Até estou vendo, até estou vendo...o encantador a dar-nos música. Como explica, por favor, V. Ex., a diferença incongruente entre a prosa apresentada e crueza das quantias? E como bem fica a dizer-se, por exemplo, "o aumento dos apoios no âmbito da ação social escolar, de forma a contrariar as crescentes desigualdades sociais" - e sumir com meio milhão da proposta de orçamento destinada a esta ação...?! É sacar da flautazinha e a questão fica sanada. Ainda agora começou. Bem que tento perceber, mas tenho em mim dificuldades. E como assim, como faz isso? Como contrariar as crescentes desigualdades sociais através de um aumento dos apoios no âmbito da ação social escolar, e lá ter menos meio milhão orçamentado? Sem orçamentação não existirá execução, certo?! Ah, não, é que connosco, é tudo para executar! Bom, desculpem lá qualquer coisinha, mas teimo mesmo em manter muitas reservas relativamente a economistas que comparam alhos com bugalhos... ou é demagogia, outra vez, ou é pior, incompetência. Saberão da teoria, pelo menos apregoada, e que apoiar é ajudar, ajudar a sociedade, quem mais precisa de uma mão, mas tirá-la lá do bolso, lá do bolso onde tem notas, isso então é mais difícil. Abre a cesta e toca a flauta!