Opinião

É populismo, mas é caro

I. Não sou eu que o digo. Quem o disse – e de forma bastante veemente – foi Passos Coelho, no encerramento do XXII Congresso do PSD, a minutos 21 e seguintes da sua intervenção. “Quando é que acaba este populismo barato?!”, perguntou o Presidente do PSD, chocado com o facto de o Governo da República propor um aumento do salário mínimo e uma descida da Taxa Social Única (TSU) sem que, a seu ver, as finanças públicas e a economia estejam preparadas para acomodar, sustentadamente, estas alterações. E disse mais a este propósito. “Há quem, para ganhar no dia-a-dia, não se importe de ceder à ditadura do curto prazo, da espuma dos dias”, afirmou indignado Passos Coelho, procurando atribuir um cunho eleitoralista e irresponsável às medidas anunciadas pelo Governo da República. II. Os representantes dos social-democratas dos Açores exultaram, aplaudiram, sorriram uns para os outros, talvez porque sentiram, por momentos, que havia uma ligeira hipótese de Passos Coelho ser reabilitado, mas não creio que se tenham apercebido da gravidade da questão. É que tudo o que o líder nacional do PSD disse serve, sem tirar nem por, como argumento para anular a única novidade que Duarte Freitas apresentou aos Açorianos em três dias de Congresso – a descida, em dois pontos, do IVA na Região. No meio da leitura do manifesto eleitoral do PSD/Açores às Regionais de outubro passado, que alguns terão pensado tratar-se do discurso de encerramento do Congresso, depois de ter reafirmado que queria fazer tudo o que a maioria dos Açorianos lhe disse que não queria, Duarte Freitas disse uma coisa nova: o PSD vai propor a descida de dois pontos na taxa normal do IVA, alargando ao máximo o diferencial fiscal e procurando, deste modo, “dinamizar a economia”, retirando, ao mesmo tempo, o dinheiro “dos bolsos do Governo Regional” (é já um fetiche, esta coisa dos bolsos do Governo e dos seus membros). Ora, aplicando a esta proposta a grelha de análise de Passos Coelho às medidas do Governo da República, é imperioso perguntar desde logo se as finanças públicas e a economia estão em condições de sustentar uma descida da receita fiscal? Depois, e no caso de não estarem, importa perceber se o PSD/Açores não estará a fazer precisamente aquilo que Passos Coelho apelida de “populismo barato”, cedendo à “espuma dos dias” e aos apelos do curto prazo. III. Deixemos que seja o próprio Duarte Freitas a responder à primeira questão. A este propósito, no seu discurso, começou por dizer que “as eleições não mudam a realidade” e que há um “manto de publicidade enganosa do Governo”, porque as coisas estão muito piores do que parecem – as coisas, leia-se, em termos financeiros. Depois concretizou, avançando que “a Região não paga o que deve” e que “há empresas públicas que não cumprem os seus compromissos”, incluindo faturas de luz e de água. Ou seja, e para resumirmos, porque o rol era muito mais longo, as finanças públicas precisam de reforço. Apesar de haver muitos caminhos para se chegar ao suposto reequilíbrio das contas públicas, todos eles recaem sobre o contribuinte, seja ele indivíduo ou empresa. Logo, se as finanças públicas, no entender de Duarte Freitas, não estão tão sólidas como o Governo Regional apregoa (e, já agora, todas as instituições independentes nacionais e internacionais que atestaram as contas do país, incluindo mais recentemente o economista João César das Neves), e se é preciso torná-las sustentáveis, propor uma descida da receita fiscal será uma forma de “populismo barato”? IV. Sim e não. Sim, porque é populismo. Não, porque não é barato, é caro. Chegamos, então, à conclusão evidente de que a única proposta nova de Duarte Freitas é, pela cartilha do PSD, uma tremenda irresponsabilidade e, pela bitola da verdade, um enorme logro. Se a Região pode prescindir de receita fiscal é porque está fantástica do ponto de vista das suas finanças. Mas, se tem as finanças equilibradas, então o que o PSD anda a dizer sobre as contas públicas não é verdade. E daqui não há como sair. Se tivesse de comentar, Passos Coelho diria, à semelhança do que disse no Congresso: “há quem para ganhar no dia-a-dia não se importe de querer agradar a toda a gente. Quando é assim, pode-se resistir algum tempo, mas normalmente perde-se o mais importante: a transparência democrática e a filiação que devemos à nossa consciência sobre o que é o melhor para o futuro”.