Opinião

O homem novo

“Nós na nossa vida precisamos de mais do que de ciência. Precisamos de poesia, precisamos de arte nas suas mais variadas expressões”. Ao ouvir esta frase fiquei incrédula com quem a tinha proferido. O nosso Primeiro. Agora que se aproximam as eleições tem-se desdobrado em operações de charme. Tentando passar uma borrachinha naquilo que tem sido para nós. E jura que não disse nada do que nós ouvimos. Não mandou os jovens emigrar, tratou-se apenas dum “mito urbano”. Mas disse mais. Fazendo de si o melhor possível. Disse que a sustentabilidade da Segurança Social não é “um papão”, que quer mais licenciados no país, e uma sociedade “muito amiga” das crianças, disse que os profissionais de saúde são extraordinários, e disse que a poesia é que nos salva. As suas mais recentes tiradas são as de um homem sensível e humanizado. Não será por acaso. Gosto deste homem novo, e se não fosse, como todos os portugueses, vítima da sua tortura fiscal e, se não visse ainda o país empobrecido que temos, poderia até acreditar que, desta vez, iria ser diferente. O novo Passos não é uma casualidade interessante, é uma necessidade emergente. Há umas eleições para ganhar. Escusava era de pôr a poesia ao barulho. Mas é preciso humanizar o boneco. Os portugueses admiram a sua determinação férrea, que se tempera agora com a dimensão humana. A doença da mulher, o leitor juvenil, o cozinheiro de papos de anjo. O cunho de normalidade que falta. E nada melhor do que juntar crianças e poesia para dar este vislumbre de sensibilidade. É inédito na figura. Mas é fundamental. Os mais incautos ficarão encantados, os outros surpreendidos e, no meio disto, haverá quem acredite no homem doce por detrás da austeridade. Quem se deixe embalar pela fala subitamente mansa. Surpreendentemente igual à do vizinho do lado, despenteando um pouco a pala e pondo a nódoa humana no casaco.