Opinião

Os fanáticos e os fofinhos!

Ondas de choque das Europeias Passada uma semana das eleições europeias, as ondas de choque provocadas pelos seus resultados ainda se fazem sentir. Na maioria dos países europeus, com honrosas excepções, a direita e os partidos extremistas - ditos, anti-sistema, anti-Europa ou nacionalistas (pseudo-independentistas) -, ganharam as eleições. Qualquer observador menos atento poderia ficar intrigado com facto dos partidos de direita continuarem a constituir o maior bloco de deputados do Parlamento Europeu, apesar dos resultados desastrosos das suas políticas, sobretudo a nível social. Após uma análise mais atenta ao espectro político europeu, estes resultados são perfeitamente naturais e até constrangedoramente compreensíveis . Nestas eleições europeias, infelizmente, estiveram em debate apenas dois caminhos: o que preconiza a inevitabilidade da austeridade enquanto rumo para o crescimento económico e, um outro, não organizado, mais anárquico, cujo objecto apresentado aos eleitores é exactamente o fim da razoabilidade política e sistêmica apresentada pelos tradicionais partidos, ditos do "centrão". A resposta para a pergunta sobre a razão da estrondosa derrota dos partidos socialistas democráticos e sociais democratas, está, exactamente, na dificuldade que temos em enquadrar os seus programas eleitorais numa destas alternativas. Os partidos sociais-democratas (chamemos-lhes assim, na sua versão europeia onde se inclui o nosso PS) preconizam também a inevitabilidade dos sacrifícios, da reforma das instituições, entenda-se, pela sua redução de importância ou de peso na economia. De alternativa ou de mudança, apenas conhecemos os slogans eleitorais, pois apresentam-se, de uma forma pouco perceptível, como os partidos da austeridade ténue, ou da austeridade mais "fofinha", cujo objectivo último de redução, do papel do Estado e do peso do factor trabalho é o mesmo da direita, variando apenas a forma e a intensidade. Os resultados eleitorais na União Europeia e, especialmente, em Portugal, revelam exatamente que os Europeus, revoltados com a situação que estão a viver, confiam mais nos partidos da direita austeritária e nos partidos anti-sistema, do que na social-democracia tímida e pouco compreensível. A resposta ao perigo da Deflação Se dúvidas houvesse sobre o que está mal na União Europeia e nos seus protagonistas políticos a resposta à possibilidade de deflação na zona euro, pela parte das suas instituições, é disso um exemplo paradigmático. Há mais de um ano que os economistas avisam para o perigo de uma baixa generalizada de preços na zona euro, liderada pelos países do sul, com a possibilidade de consequências gravíssimas ao nível do emprego e da competitividade das nossas exportações. A valorização do euro e a descida generalizada de preços são sucessivamente desvalorizadas pelos nossos políticos e dirigentes, todos eles nascidos e criados numa época onde a inflação arruinava as economias e o poder de compra das famílias. Aliás, ainda hoje, quando se fala em deflação, apesar dos graves danos por ela criada na crise de 2008 nos países do sul da Europa, muitos políticos sorriem ignorantemente, pensando, com indisfarçável egoísmo, no aumento do poder de compra das famílias. Ora enquanto a inflação "mói", a deflação mata - "as famílias adiam o consumo, os empresários o investimento, conduzindo a economia ao que se chama depressão (i.e., período de tempo longo, caracterizado por elevado desemprego, baixos níveis de produção e de investimento, número elevado de falências de empresas e baixos níveis de confiança dos agentes económicos)." Mas perante este risco o que podem as instituições europeias fazer? Ao meu caro leitor respondo, dizendo, que apesar dos manuais de economia serem muitos claros sobre esta matéria, a pergunta está mal formulada, devendo antes ser enquadrada assim: O que estão as instituições europeias disponíveis a fazer para evitar o risco de deflação? As taxas de juros referência já estão em valores mínimos históricos, podendo baixar, inclusivamente, para valores negativos, mas sem grande efeito na economia, pois já estamos a falar em valores na ordem da décima de ponto percentual. O BCE afirma agora que está disposto a mutualizar a dívida resultante dos investimentos das empresas na economia, através de instrumentos financeiros complexos, como forma de garantir o acesso das pequenas e médias empresas ao crédito e, com isto, estimular o investimento e o consumo provocando alguma inflação. Ora, esta nova política não só é completamente absurda e irresponsável, como é atentatória da própria lógica da União Europeia. É uma insanidade, achar que os instrumentos financeiros complexos que nos levaram à Grande Recessão, em 2008, não nos levarão, nesta nova versão garantida pelo BCE, aos mesmos resultados do passado. Também me sinto "gozado" enquanto português e desiludido com o facto do BCE estar disposto a mutualizar, com risco, a dívida de privados que não conhece e, por sua vez, não esteja disposto a mutualizar a dívida do meu país, propiciando, assim, mais crescimento económico e uma redução da austeridade para os cidadãos. Somos governados a nível europeu por um pequeno comité dos grandes países, onde mandam, sobretudo, os interesses da Alemanha e dos tecnocratas e onde os outros países não batem o pé. Infelizmente não há alternativa política razoável para nada, por falta de comparência da verdadeira social democracia, por falta de protagonistas à altura, podendo significar, no médio prazo, o fim do projecto europeu.