Opinião

Basta falar verdade

Alguns partidários mais ferrenhos deste Governo da República estão espantados com a enorme polémica gerada pelo anúncio, do Primeiro-Ministro, de mais medidas de austeridade para os portugueses. No seu raciocínio (profundamente errado), o Governo, com estas medidas adicionais de austeridade, não só resolve o problema da inconstitucionalidade dos cortes dos subsídios aos funcionários públicos, como também, diminuiu os encargos das empresas com os trabalhadores, tudo isto, associado a um aumento das receitas fiscais e da segurança social que permitem suportar o défice a valores impostos pela Troika. Esta análise, a meu ver, parte de pressupostos que não existem ou então de falácias criadas por este Governo, senão vejamos: Em primeiro lugar, o conjunto de medidas adicionais de austeridade tomadas, levanta, na maior parte dos constitucionalistas, sérias dúvidas sobre a legalidade das mesmas, pois não só não há justiça na repartição da austeridade como, inclusive, esta desigualdade é agravada. Na prática, podemos chegar ao cúmulo destas medidas voltarem a ser consideradas inconstitucionais a meio do próximo ano, obrigando o país a resolver esta situação à pressa o que não augura nada de bom. Em segundo lugar, assumir que a redução dos encargos das empresas (fruto da redução da Taxa Social Única) à custa do rendimento dos seus trabalhadores vai aumentar a competitividade das empresas, neste contexto, é um erro brutal deste Governo em termos económicos. É esquecer que quem recebe menos, consome ainda menos. É esquecer que a maior parte das nossas empresas vivem do consumo interno. Na prática é dizer a uma empresa que vai poupar 10 com a remuneração dos seus trabalhadores e vender menos 20 pois ninguém tem dinheiro para comprar os seus produtos. Destas medidas, só tirarão benefícios as empresas em situação de monopólio ou em oligopólio e as empresas exclusivamente exportadoras, ou seja, o nosso mercado interno continuará moribundo. Em terceiro lugar, assumir que as receitas do Estado terão um aumento em montante suficiente para corrigir o défice do Estado é enganar de novo os portugueses. O que o tempo tem comprovado é que sempre que se aumenta a austeridade, as receitas fiscais diminuem e a despesa aumenta, fruto da quebra da atividade económica e do aumento do desemprego e das falências. Mas, mais do que as análises económicas destas medidas, o que, de uma forma muito preocupante, o PSD no continente e nos Açores, ainda não percebeu é que o povo revoltou-se com a incongruência/logro dos seus discursos. Não podemos à segunda-feira dizer, que estamos no caminho certo para sair da crise e à sexta-feira, à hora do futebol, anunciar medidas adicionais de austeridade para corrigir o falhanço destas mesmas políticas. Não podemos à segunda-feira dizer, que a Região está à beira da falência e à sexta-feira, prometer um aumento de pista no Faial (47 a 70 milhões de euros), um viaduto no Nordeste de milhões de euros para ganhar 100 segundos de caminho ou uma fábrica nova para a Sinaga (pode chegar aos 19 milhões de euros). Não podemos à segunda-feira dizer que “o Dr. Passos Coelho está a fazer aquilo que na sua perspectiva é o melhor para o país” e à sexta-feira afirmar que se está contra as medidas de austeridade da república. Não podemos à segunda-feira dizer, que queremos cortar nos vencimentos dos políticos e no número de deputados, para com esta poupança compensar parte da perda do rendimento dos trabalhadores nos próximos dois anos e à sexta-feira, percebermos, que a implementação destas medidas, no caso dos vencimentos dos políticos demora pelo menos um ano e da redução dos deputados só terá aplicação daqui a quatro anos. Na prática, o que espanta estes políticos é a sua incapacidade para perceber que os cidadãos querem que lhes falem verdade, que se assumam os erros cometidos, que se diga qual o projeto que está a ser desenvolvido e que, sobretudo, se transmita esperança para um futuro melhor.