Opinião

Má Moeda em Belém

Recorrendo a um estilo muito próprio do ofício diplomático, o Ministro dos Negócios Estrangeiros português concedeu uma entrevista ao semanário Expresso, do passado Sábado, que está a marcar a agenda política nacional. Sem nunca empregar a palavra “governabilidade” o que Luís Amado abordou foi precisamente esta questão. A sua tese central é de que “somos o único país na Europa onde temos a situação aberrante de a oposição e o partido maioritário não terem conseguido iniciar um diálogo com vista à constituição de uma plataforma de governo”. Porém, o aspecto mais destacado da entrevista foi a confessada disponibilidade de Amado “ceder o lugar” para facilitar a constituição de uma grande aliança política, tipo junta de salvação nacional. O desprendimento de Amado foi lido como um recado para o Primeiro-ministro, no sentido de sublinhar que Sócrates seria o verdadeiro obstáculo a uma solução para o País. Independentemente das interpretações que cada um faça da referida entrevista, há uma questão de fundo que sendo tão evidente é estranho ninguém a ter salientado. O maior visado na entrevista de Luís Amado é o Presidente da República (PR). Cavaco Silva é o grande responsável por não existir em Portugal um governo apoiado numa maioria absoluta parlamentar. Perante um governo de minoria o PR assume maior peso no sistema político mas Cavaco não tem perfil para desempenhar esse papel. O próprio discurso de Cavaco na apresentação da sua recandidatura confirma este aspecto. Ele “previu”, “alertou” e “avisou”. Ele sabia tudo mas não fez nada. A apregoada omnisciência de Cavaco é o reverso de uma – má - moeda, o que impõe uma questão óbvia: o que fez objectivamente Cavaco para garantir a governabilidade de Portugal aquando da tomada de posse do actual governo Sócrates? Não fez nada, o que só prova que Cavaco não é o PR que Portugal necessita.