Opinião

Quando o medo cala, a democracia empobrece

Escrevo hoje estas palavras, não como Deputada Regional, não como candidata à Câmara Municipal da Horta, nem como colaboradora de uma empresa de capitais exclusivamente públicos. Escrevo como cidadã. Como mãe de dois filhos, como esposa, como encarregada de educação. Como filha da liberdade. Como alguém que, tal como muitos na nossa sociedade, também hesitou um dia.

Neste assunto, como em tantos outros, é fundamental falar com frontalidade, sem rodeios e sem eufemismos. Há momentos em que é preciso “chamar os bois pelos nomes”, sem medo de que a verdade nos traga mais desconforto, do que o silêncio confortável da omissão.

Escrevo há quase duas décadas na imprensa regional. Naturalmente, a minha opinião tornou-se pública, a minha ideologia política visível, as minhas causas conhecidas e tantas vezes julgadas ou distorcidas. Senti o peso dos olhares, das insinuações e das narrativas enviesadas. Também eu me perguntei se valia a pena continuar a exercer a cidadania de forma ativa e destemida. Se estaria a colocar em risco o meu nome, o meu futuro, a minha liberdade. Hoje, compreendo bem quem sente medo. Porque também eu já o senti. E também eu me calei. Mas hoje, não mais.

O medo que muitos sentem de se envolver politicamente, de assumir uma posição, de pertencer a um partido, é real. Não é fruto da imaginação. Não é exagero. É o receio de perder oportunidades, de ser discriminado, de ver portas fecharem-se sem aviso ou justificação. Quantos jovens já ouvi confessar: “Quero fazer a diferença, mas não quero ficar marcado”? E quantos adultos se retraem por medo de prejudicar os seus filhos?

Este silêncio forçado empobrece-nos. Enfraquece o debate. Enfraquece a democracia. Afastamos as melhores pessoas, alimentando a ideia de que a política é suja, interesseira, feita de conflitos e insultos estéreis. Mas não tem de ser assim.

Estar na política não é vender a alma. Não é alinhar com tudo. Não é perder a identidade. Pode, e deve, ser um ato de liberdade, de resistência, de serviço público. Precisamos de mais gente com coragem. Com sentido de missão. Com vontade de contribuir, sem medo.

Permitam-me por isso partilhar um pouco da minha experiência: sou quadro de uma empresa pública desde 2007. Trabalhei com administrações nomeadas por governos de diferentes orientações políticas. Tive diretores de todas as “cores”. E, à exceção de um caso pontual que vivi na pele há muitos anos, sempre prevaleceu mais aquilo que nos unia enquanto equipa, do que aquilo que nos separava. Porque numa empresa, como na vida pública, há um objetivo comum: servir bem, cumprir a missão, alcançar resultados. E isso só acontece com equipas alinhadas, motivadas e respeitadoras da diversidade.

Foi assim que sempre encarei o meu trabalho. Dar o melhor de mim, todos os dias, em prol de um bem maior. Talvez por isso hoje tenha orgulho das relações de amizade e respeito que mantenho com muitas das chefias que fui conhecendo, à margem das suas convicções políticas. Nunca faltou debate, confronto de ideias, momentos de tensão. Mas também nunca faltou sentido de responsabilidade, nem a consciência de que todos remávamos para o mesmo lado.

É urgente desconstruir este medo. É preciso afirmar que a atividade política não significa seguidismo, nem silêncio. Que é possível estar na política e manter o pensamento crítico, levantar a voz, discordar. A política precisa de mais exigência, mais verdade e mais participação. E muito menos medo.

A política não é um lugar de alguns. É de todos. É sua. É nossa. E só muda se lá estivermos. Não chega comentar de fora. Não basta dizer “isto está tudo mal” ou “isto está tudo bem”. A democracia precisa da nossa voz, da nossa coragem, da nossa vontade de construir algo melhor. Dá trabalho? Sim. Por vezes magoa? Sim. Mas também é, talvez, uma das formas mais profundas de amar: amar a nossa terra, o nosso País, o nosso planeta, ao ponto de querermos transformá-lo.

Não deixem que o medo vença. Participar não é ceder. É pensar. É discutir. É não desistir.