Opinião

Homenagem a um resistente à Ditadura e opositor ao Estado Novo

A poucas semanas que estamos das comemorações dos 50 anos do “25 de abril”, dedicarei esta edição ao meu bisavô João Silveira Bettencourt, cuja vida foi dedicada à luta pelos ideais democráticos.

Nasceu na ilha Graciosa em 4 de abril de 1896, formou-se como professor do ensino primário, no entanto nunca exerceu essa profissão, tendo-se alistado voluntariamente nas Forças Armadas – a sua verdadeira vocação. Foi Comandante da Guarda Fiscal, na cidade da Horta, tendo depois seguido para uma comissão em Lisboa, com a patente de Tenente da Guarda Nacional Republicana. Ali, iniciou uma incansável luta pela democracia e liberdade, registada meticulosamente no seu diário "Diário de um Deportado Vítima do Totalitarismo da Época", durante os três anos, um mês e um dia em que esteve preso e deportado.

Em março de 1926 (antecedentes do Golpe de 28 de maio do mesmo ano) revoltou-se contra a situação social e os conflitos políticos da época, liderando uma rebelião cujo quartel-general foi estabelecido na Travessa do Salitre, em Lisboa.  No dia 9 de fevereiro de 1927, os revoltosos rendem-se, por volta das 20 horas, porque, como escreveu no seu diário, “lhe faltaram as munições e por ser impossível a meia dúzia de gatos pingados vencermos toda a guarnição de Lisboa”. Esta foi a primeira tentativa de derrube da ditadura militar que se tinha instituído no golpe do 28 de maio de 1926 e que teve um saldo sangrento: 80 mortos e 360 feridos no Porto e mais de 70 mortos e 400 feridos em Lisboa.

Após uma série de eventos, incluindo a sua deportação para a Guiné Portuguesa e uma posterior revolta nos Açores em 1931, foi novamente deportado, desta vez para Cabo Verde. No ano de 1932 retornou à Ilha Graciosa onde foi colocado sob residência fixa, tendo posteriormente mudado para o Faial, onde se manteve até ao seu falecimento, em 1980.

Dedicou-se, profissionalmente, à contabilidade, nos Grandes Armazéns Faialenses e na empresa J. Peixoto de Ávila, na cidade da Horta. Fez parte, também, dos corpos sociais e foi sócio efetivo de inúmeras instituições de solidariedade social, desportivas e culturais. Escreveu também para vários jornais como a Gazeta de S. Miguel, o Alma Nova e foi redator do jornal republicano Pátria Livre, além de colaborações nos jornais locais.

Apesar da sua intensa atividade política e dos anos de sofrimento que enfrentou, o meu bisavô é recordado pela sua humildade, integridade e sensatez, além da sua coragem na defesa da liberdade e da democracia.

O dia 25 de abril de 1974 foi um dos mais felizes da sua vida, tendo meu avô relatado que o seu pai “chorou como uma criança pequena” com o desenlace da Revolução dos Cravos.

A 1 de maio desse mesmo ano, foi designado para colocar um ramo de cravos junto à estátua do Primeiro Presidente da República eleito, Manuel de Arriaga, facto que o deixou extremamente orgulhoso. Em 2005, a Câmara Municipal da Horta prestou-lhe homenagem pela sua dedicação à luta pela liberdade e democracia, atribuindo o seu nome a uma rua no antigo Bairro de Fundo de Fomento.