Opinião

Regresso ao passado?

A Moção de Estratégia Global do III Congresso Regional do Chega Açores aprovada, por unanimidade, no passado fim de semana, representa a apologia de um regresso a um passado que julgava (ingenuamente) poucos quererem voltar. É verdade que o número de congressistas não foi significativo (cerca de 30), mas estamos na presença da linha orientadora do quarto maior partido dos Açores (eleições 2020). Segundo a dita moção, “É chegada a altura de voltar a colocar os símbolos religiosos nas escolas e locais públicos em vez de fotografias de presidentes que se julgam donos dos açorianos”. José Pacheco, na sua intervenção, relativamente a este assunto, referiu o seguinte: “Não posso tolerar que destruam a minha história para que construam uma história alternativa. Não posso tirar os símbolos religiosos de todo o lado. E a maioria que acredita? Quem os respeita? Ninguém. Merecemos respeito. Não nos tirem o que temos. Por que nos retiraram os crucifixos? Só porque não acreditam? Eu não retiro a liberdade a ninguém.” Outra das demonstrações do sentido preocupante da marcha do Chega Açores foi a defesa do conceito “tradicional de família”. Tal como a continuação da senda persecutória aos beneficiários do RSI. O recém-eleito Presidente do Chega Açores afirmou, no meio de palmas, que “há pessoas que não trabalham porque não querem”. E continuou referindo que “Andamos a pagar para não fazerem nada. Estou-me marimbando que me chamem de xenófobo, de fascista, de racista. Não me incomodo: estou preocupado pelo futuro do meu filho porque este Estado está a pagar para não se produzir.” Confesso que esta visão sobre a liberdade religiosa, a qual visa repor uma religião oficial; esta visão sobre o regresso do anacrónico conceito de “família tradicional”; e esta visão sobre solidariedade social, entre muito outros dislates, incomodam-me profundamente. Mesmo não me surpreendendo nada. O Partido de André Ventura é isto. Os eleitores sabem perfeitamente o que a casa gasta. Ventura tem a ambição de implementar uma “nova República”. Ventura não se revê nos princípios e valores fundamentais consagrados na Constituição da República Portuguesa. José Pacheco, sendo vice-presidente do Chega, aproveitou o palco do congresso para ser porta-voz do seu pequeno deus e líder supremo. Daí que toda a intervenção de José Pacheco tenha, eventualmente, de ser contextualizado. Mas mesmo assim, excluindo os exageros linguísticos, olho para José Pacheco e consigo ver um mini Ventura.
E é aqui aumenta a minha preocupação. E não me refiro ao facto da sobrevivência do XIII Governo dos Açores estar dependente das cedências ao Chega. Isso, a seu tempo, será resolvido… O que me inquieta e incomoda, profundamente, é viver numa Região em que começa a normalizar-se, através de uma certa suavização, ideologias e comportamentos que são a antítese da Açorianidade. O Chega defende uma Região em que eu não quero viver. E acredito que 99,9% dos Açorianos também não querem. Por isso, é bom que numa próxima oportunidade se estanque este saudosismo…